A decoração da Vila Junina concentra toda riqueza cultural de Amargosa em um único espaço

A cidade que carrega o verbo amar no nome recebe um carinho especial quando o assunto é São João. Em Amargosa, localizada a 241,8 km de Salvador, os festejos juninos são anunciados com entusiasmo pelos moradores, e a decoração da Vila Junina encanta os olhos de quem a visita. Por isso, o município se tornou a quinta parada do projeto “São João da Bahia – Fogo que Não se Apaga”.
Fundada em 1891, Amargosa completou 133 anos em 2024 e, ao longo de sua história, vem se destacando especialmente no período junino. Reconhecida pela Confederação Nacional dos Municípios como a “Cidade do Forró”, no ano passado o município recebeu mais de 250 mil visitantes, movimentou mais de R$ 40 milhões e gerou mais de dois mil postos de trabalho diretos e indiretos entre os dias 19 e 24 de junho.
Mas antes mesmo da festa começar, o cortejo Bando Anunciador Acorda Maria Bonita, criado em 2015 pela família Araújo, toma conta das ruas da cidade. Ao som do forró, o grupo percorre o município anunciando a chegada do São João.
“O bando foi criado para que a gente revivesse o São João das ruas. Aquele São João com grupos de amigos passando pelas casas, aquele clima em que as pessoas eram recebidas com licor, paçoca, canjica […] Depois que o São João passou a ser muito marcado pelos grandes shows, sentimos vontade de resgatar esse outro movimento cultural, que eu vivi na infância”, conta Mariangela Araújo, cofundadora do bando e bacharel em direito.

Segundo a cofundadora, o grupo escolheu a figura de Maria Bonita pelo seu valor histórico e cultural para as mulheres, além de sua conexão com a música. “As histórias, a literatura e as fotos mostram que o forró sempre esteve presente nos acampamentos dela e de Lampião”.
Composto por 20 pessoas vestindo fantasia de cangaceiro, o grupo realiza o cortejo da praça Santa Rita, até a praça do Bosque, sempre no primeiro dia do São João. Este ano, a data escolhida é 20 de junho, a partir das 16h. Apesar de começar com um grupo pequeno, ao longo do percurso o número de participantes chega a quadruplicar.
Para Ivan Araújo, um dos organizadores e irmão de Mariângela, um dos momentos mais especiais da festa é escolher a roupa. Após os primeiros anos sem fantasia, ele assumiu a criação dos croquis dos figurinos do grupo. “No primeiro ano, a gente vestiu qualquer roupa e saiu. Eu mesmo fui com uma roupa emprestada”, relembra.
Desde então, o professor do ensino fundamental passou a desenhar os modelos de cada edição. “Todo ano a gente planeja o figurino e ele precisa ter chita e cetim. A chita, porque é colorida e o São João é uma festa colorida. Para mim, ela representa essa alegria. E o cetim, porque dá brilho. Como saímos de dia e só voltamos à noite, o cetim dá aquele ‘pá’”, diz aos risos.

Após a passagem do bando, é oficial que o São João começou. Os fornos entram em ação, a produção de licor se intensifica e as comidas típicas ganham força total.
O Licor com Caldas, da professora aposentada Edvany Caldas, mais conhecida como Prof. Vany, é um dos sucessos da cidade. Com alcance internacional, a produção da bebida começou em casa, a partir de uma receita do avô da empresária.
“Eu acompanhava meu avô nessa dinâmica de fazer licor, porque ele era devoto de vários santos, a [devoção] mais forte era por Santo Antônio. Ele tinha toda uma técnica, deixava o licor em conserva por muito tempo, colocava em potes de barro e enterrava. Eu achava aquilo muito interessante e fui acompanhando todo o processo”, destaca. “Depois de um tempo, meu avô faleceu, e minha mãe, que também era devota, [mas] de Santa Luzia, continuou fazendo licor para servir depois das rezas. Como minhas irmãs foram embora e eu continuei morando aqui, decidi manter a tradição e seguir fazendo o licor nos períodos de festa”, lembra Edvany.
“Meus amigos e os amigos da família sempre pediam para eu vender. Diziam, ‘quero um licor!’. Naquele tempo, eu ainda dava de presente. Mas depois que me casei, vieram os amigos do meu marido pedindo também e era cada vez mais gente. Aí não teve jeito, tive que começar a vender”, conta, sorrindo, a professora aposentada.
Segundo Edvany, neste ano a produção começou em fevereiro, e os primeiros pedidos chegaram em abril. Atualmente, são 12 sabores diferentes, uma mistura entre os tradicionais e os cremosos — com destaque para os de jenipapo, gengibre e chocolate com pimenta.
“Lá pelo dia 19, 20 de abril, as pessoas que já têm o costume de comprar começaram a me perguntar se este ano teria licor. Já foram logo apertando minha mente pra eu começar a produzir. Acabei começando a vender mais cedo este ano […] Rio de Janeiro, São Paulo, Santa Catarina, Maranhão… esses lugares eu tenho certeza que já receberam meu licor, porque são pessoas que vieram curtir a festa aqui e levaram na viagem”, recorda a empresária.

“O sabor do gengibre é aquele que aquece a gente, porque Amargosa é uma cidade muito fria no São João. Ele está pau a pau com o de jenipapo. E o de chocolate com pimenta também tem feito sucesso — os clientes estão adorando, e é uma delícia”, destaca Edvany.
Outro destaque gastronômico de Amargosa é a barraca de Ana Bela. Natural de Laje, na zona rural de Serrinha, há 40 anos ela encontrou no município um lar. “Vim para Amargosa quando me casei e comecei a trabalhar com gastronomia para ajudar nas despesas”, conta.
Na barraca de Ana Bela, são vendidos os tradicionais pratos da culinária baiana, feijoada, mocotó, cozido e galinha caipira. Mas durante o São João, o cardápio ganha novos sabores. “A gente faz uma mudançazinha, coloco cuscuz, bolo de milho, milho cozido, mingau de milho e outros”.
A chef de cozinha destaca que recebe muitas encomendas de visitantes que compram seus pratos para levar e compor o cardápio em casa. “Tem gente que pede duas, três galinhas já prontas. Tenho fregueses que vêm da Ilha e, todo ano, eles almoçam aqui e ainda levam comida com eles”.
Onde o amor pelo São João vira tradição
No coração da festa junina de Amargosa, pontos turísticos da cidade ganham versões em miniatura para decorar a praça principal, onde os festejos acontecem. Nela, a Vila Junina — composta por barracas decoradas, coloridas e com bandeirolas — é um dos pontos altos da celebração.
“Hoje, temos uma vila cenográfica montada no bosque, onde garantimos o resgate e a valorização da cultura local. Nessa vila, acontece o projeto Café com Forró, criado em 2023 para fortalecer a agricultura familiar. Nele, nós — enquanto gestão — envolvemos fazedores de cultura ligados à gastronomia e ao artesanato”, conta Carlos Munõz, Superintendente de Cultura de Turismo de Amargosa.

“Firmamos uma parceria com o Senac, por meio da qual os participantes recebem capacitação em cursos e, depois, ganham três barracas para oferecer, pela manhã, um café coado, ovo frito de quintal e a famosa carne de sol, que a gente costuma dizer ser a melhor da região”, brinca Carlos.
Além disso, Carlos destaca que o São João tradicional continua vivo na cidade. Durante o dia, visitantes e moradores podem aproveitar bandas locais e o tradicional arrasta-pé. Já à noite, é a vez das grandes bandas nacionais subirem ao palco.
Este ano, o São João de Amargosa acontecerá de 19 a 24 de junho, e contará com shows de Simone Mendes, Iguinho e Lulinha, Toque 10, Calcinha Preta, Limão com Mel, Adelmário Coelho, Léo Foguete e Alcymar Monteiro. Além disso, a cidade sediará um festival de forró com apresentações de Chico César, Adelmário Coelho e outros artistas.
Quando o festejo chega ao fim, no último dia do São João, o Forró Pé de Serra da Zona Rural reúne artistas da região, moradores e visitantes para celebrar a despedida de mais um ano de festas.

“O nosso músico Peu Meurray reúne todos os músicos da cidade — registrados no cadastro de cultura —, coloca todos sobre uma ‘prancha musicada’, e saem percorrendo as ruas ao som do forró. Turistas e moradores acompanham o cortejo, sacudindo seus chapéus de palha em agradecimento pelo São João, trocando abraços na despedida e renovando o compromisso de se encontrarem no ano seguinte”, encerra Carlos Munõz
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