O bicho tá pegando em Salvador, isso é fato. Nos últimos dias, não há sequer um morador da capital baiana que tenha ignorado o aumento dos casos de violência. Provavelmente, também não há uma só pessoa dessa cidade que tenha deixado de consumir jornalismo para se manter informado sobre o assunto.
Troca de tiros, mortes violentas, famílias inteiras sendo feitas reféns em suas próprias casas e por aí vai. Por si só, esses fatos já têm a capacidade de provocar medo e espalhar o sentimento de insegurança. Tudo isso é fato, é notícia em qualquer lugar do mundo e precisa ser comunicado, tem que ser amplamente explorado pela imprensa. Não há como tapar o sol com a peneira. E nem é função da imprensa esconder o jogo ou criar uma falsa narrativa de que tudo vai bem.
O que tem sido difícil de engolir é a forma, não o conteúdo.
A cobertura jornalística tem gerado ainda mais medo e praticamente ignorado a complexidade do assunto. O tráfico de drogas é um negócio organizado e consolidado, movimenta bilhões todos os anos no Brasil. Nenhuma polícia é capaz de “vencer o tráfico” e isso é tão óbvio que eu nem preciso ser especialista em segurança pública para fazer essa afirmação.
Também é óbvio que a imprensa tem de noticiar fatos sobre essa guerra que temos visto todos os dias nas ruas de Salvador. Tem que noticiar mesmo, o trabalho jornalístico não pode ser atacado ou intimidado!
Mas será que a imprensa pode entrar no assunto com mais profundidade e cobrar respostas às autoridades de forma mais inteligente, à altura do problema que estamos enfrentando? Noticiar o óbvio, sem trazer qualquer outro elemento ao debate, é uma lástima nesse contexto.
Tratando o assunto dessa forma, a imprensa apenas informa e produz mais medo. E o medo é combustível para os traficantes. Eles se alimentam do pavor da população para promover mais ataques e fazer o “negócio” avançar em novos territórios da cidade. E, de novo, não é preciso ser especialista para chegar a essa conclusão.
A imprensa tem papel fundamental nesse momento. Pode (e deve) cobrar respostas do poder público para um enfrentamento efetivo do problema. Só não pode tratar a questão como se fosse um mero “bang bang”. Tem que ter responsabilidade social. Precisa, urgentemente, trocar a espetacularização midiática por contribuição à sociedade.
O que temos visto, por enquanto, é um esforço midiático para potencializar a sensação de insegurança na população e, sinceramente, eu quero acreditar que isso não tem nada a ver com o suposto uso político de parte da imprensa por adversários do atual chefe do Executivo baiano.
Quero acreditar que a repetição incansável de troca de tiros na TV tem relação com a busca por audiência visando a sobrevivência de outro negócio, o jornalismo. O que já é o suficiente pra gente sentir vergonha alheia do jornalismo que está sendo feito, claro. Sendo essa a razão para fazer um jornalismo superficial sobre o tema, quero acreditar que ainda há esperança. Quero acreditar que, sim, teremos condições de assistir a reportagens que – verdadeiramente – contribuam com uma sociedade menos violenta.
Torço para que nosso jornalismo seja capaz de “apertar” o poder público no lugar certo, sem cair no descrédito que a espetacularização provoca. Com responsabilidade e inteligência.