Equipamento vai funcionar na antiga sede da Faculdade Dom Pedro II, no Comércio
O bairro do Comércio, em Salvador, vai abrigar um museu em homenagem a Maria Odília Teixeira, a primeira mulher negra formada em Medicina no Brasil. O anúncio da estrutura foi adiantado pela vice-prefeita de Salvador e secretária municipal de saúde, Ana Paula Matos, na última terça-feira (5), durante o 9º Congresso Norte/Nordeste de Secretarias Municipais de Saúde, ao portal Bahia Notícias.
O museu em homenagem à médica será construído dentro da Escola de Saúde Pública de Salvador (ESPS), que vai funcionar na antiga sede da Faculdade Dom Pedro II. O espaço servirá como preservação da memória cultural e “buscando referenciar personagens importantes na história da saúde da Bahia e do Brasil”.
Segundo a titular da Secretaria Municipal da Saúde (SMS), uma empresa do setor imobiliário já foi contratada pelo órgão para construção do local, que deve ser inaugurado ainda neste segundo semestre do ano junto com a escola. “Vamos inaugurar no segundo semestre a nossa escola de saúde pública, já contratamos imobiliárias e vai ter um museu homenageando Maria Odília, primeira médica negra do Brasil. Então esse museu vai ser na própria escola de saúde pública”, contou.
O espaço será referência para o ensino de saúde pública e contará com laboratórios de ponta. O projeto quer também ampliar a formação de profissionais da saúde para melhorar o atendimento à população no âmbito da gestão municipal do Sistema Único de Saúde (SUS); fortalecer o relacionamento com instituições de ensino e estudantes da saúde; promover estudos e pesquisas em áreas estratégicas da saúde de Salvador; além de promover a participação e o controle social por meio da educação popular em saúde.
O local deve contar também com educação avançada de tecnologia, museu interativo, biblioteca, salas multiuso e laboratórios equipados para formação de profissionais.
Quem foi Maria Odília?
Maria Odília Teixeira nasceu na cidade baiana de São Félix do Paraguaçu, em 1884. Era filha de Josephina Luiza Palma, uma mulher negra que teve a mãe escravizada e alforriada, e José Pereira Teixeira, um médico branco que, apesar da origem humilde, era bastante prestigiado na cidade. Seguindo os passos dele, ela logo decidiu que se dedicar aos estudos seria seu plano de vida.
Aos 13 anos, Maria Odília saiu de Cachoeira, onde morava com a família, rumo a Salvador para ser aluna do Ginásio da Bahia. O colégio era um dos mais tradicionais do estado, formando grande parte dos herdeiros da elite branca. Mas isso não impediu que ela também se graduasse em ciências e letras, além de dominar idiomas como francês, latim e grego.

A partir daí, a trajetória acadêmica de Maria Odília só cresceu. Em 1904, ela entrou para a Faculdade de Medicina da Bahia. Era a única mulher em uma turma de 48 alunos e foi tutorada pelo irmão, Joaquim Pereira Teixeira, veterano do mesmo curso na mesma universidade.
Em seus últimos anos como estudante de medicina, Maria Odília desenvolveu uma tese sobre a cirrose, um tema pouco explorado por médicas mulheres. O estudo foi considerado pioneiro principalmente porque fugiu do racismo científico como fundamentação. Na época, doenças associadas ao consumo excessivo de álcool eram tratadas como enfermidades comuns ao suposto comportamento degenerado de pessoas negras.
Maria Odília se formou em 1909, sendo a sétima mulher a se formar em medicina na Bahia e a primeira no século XX. Registros históricos apontam que ela também é a primeira médica negra do Brasil. Mas, como das 16 mulheres que se formaram em medicina no país antes dela, apenas 12 têm seus dados raciais conhecidos, esse é um fato que ainda precisa ser confirmado.
Logo depois de se formar, Maria Odília começou a trabalhar como médica na cidade de Cachoeira, para onde retornou. Os primeiros atendimentos costumavam ser supervisionados pelo pai ou pelo irmão mais velho. Com o tempo, ganhou confiança e credibilidade para exercer a profissão por conta própria, tratando principalmente de pacientes mulheres e sendo muito respeitada na região.
A experiência como médica em Cachoeira durou cinco anos. Em 1914, Maria Odília foi chamada para ser professora de clínica obstétrica na Faculdade de Medicina da Bahia. Ela então retornou para Salvador e se tornou a primeira professora negra da universidade.
Maria Odília lecionou até 1917, quando partiu de volta para Cachoeira após descobrir que o pai estava doente. Na intenção de cuidar melhor da saúde dele, toda a família se mudou para a cidade de Irará, no sertão baiano. Foi lá que conheceu seu marido, Eusínio Lavigne, advogado de uma família tradicional de Ilhéus. Os dois se casaram aos 37 anos de idade sem a presença da família do noivo, que, por causa do racismo, não aceitava que ele se relacionasse com uma mulher negra.
Após se tornarem pais de dois filhos, Maria Odília abandonou a carreira de médica para ter mais tempo de se dedicar a família e Eusínio decidiu entrar para a política, inspirado pelos ideais comunistas. Ele atuou como intendente da cidade de Ilhéus de 1930 a 1937, ano em que foi destituído do cargo e preso por criticar o golpe que implantou a ditadura do Estado Novo no Brasil durante o governo Vargas —Eusínio foi preso novamente em 1964 no período da ditadura militar.
Resolvida a situação, Maria Odília, o marido e os filhos se mudaram juntos para Salvador. Em 1950, ela escreveu uma carta em defesa do próprio pai como resposta ao livro “Teixeira Moleque”. Escrito por Rui Santos, a obra falava sobre o legado do médico José Pereira Teixeira.
Maria Odília faleceu aos 86 anos, em 1970.
Fontes: Alôalô Bahia e Bahia Notícias