Autora de “O homem sério que lembrou de sorrir” fala do início da sua trajetória profissional e a descoberta da escrita literária como forma de expressão
A jornalista, escritora e social media Alessandra Oliveira sempre foi apaixonada por literatura, mas antes de contar sua história pessoal precisou romper com seus próprios receios. Natural de Feira de Santana e radicada em Salvador, Alessandra lançou recentemente o livro “O homem sério que lembrou de sorrir”, em que narra a sua experiência com o pai, que foi diagnosticado com Alzheimer.
Formada em Comunicação com habilitação em Jornalismo, a profissional teve passagens por jornais impressos, como o A Tarde e há 5 anos atua como social media. Durante a pandemia, Alessandra fez um mestrado, onde estudou jornalismo para crianças.
Em entrevista à reportagem do Portal Umbu, via Google Meet, Alessandra fala do início da sua trajetória profissional e a descoberta da escrita literária como forma de expressão. Confira:
“Sou de Feira de Santana, sou caçula de quatro filhas mulheres, sempre fui boa ouvinte desde a infância. Sempre gostei de ouvir mais do que falar e aí, quando fui crescendo, fui profissionalizando a minha escrita. Então eu me graduei em Comunicação com habilitação em Jornalismo”, diz.
“Fui repórter, principalmente de jornal impresso, trabalhei mais tempo no jornal A Tarde aqui em Salvador. Sou social media há uns 5 anos, depois me formei Mestre em Comunicação, estudando jornalismo para crianças, estudei a participação desses leitores nesses veículos voltados para esse público”, conta.
Sobre o período em que cursou o mestrado, Alessandra recorda que foi bem exaustivo. “Foi bem interessante [o mestrado], mas bem cansativo emocionalmente, por conta da pandemia, voltei a morar com os meus pais e me tornei cuidadora do meu pai. Quando terminei o mestrado, falei: não quero mais ficar perto de jornalismo. Eu acho que parece que terminou tudo. Me afastei bastante, fui para o escritório de contabilidade, para prestar serviços como social media de uma empresa. Foi nesse momento, que descobri que gosto de administração”, recorda.
Foi nesse momento que a profissional começou a fazer gestão de pessoas, projetos e pensar a inovação dentro de organizações. A literatura, porém tem sido uma descoberta interessante para Alessandra, isso porque, a jornalista sempre foi uma leitora ávida, mas escrever sobre si foi desafiador.
“Estou ainda nesse processo de assimilar isso e a divulgação do livro tem me obrigado a fazer uma coisa interessante, porque, por exemplo, tive que criar um perfil profissional no Instagram para poder divulgar o livro. Então, ainda estou me descobrindo nessa coisa de falar sobre mim, porque eu sempre escrevi sobre as empresas e sempre escrevi para o outro no jornal, mas nunca falava sobre mim”, diz.
“Como eu disse: eu sempre fui boa ouvinte, mas na hora de falar, o negócio é outra história. Minha psicóloga, inclusive, acha super engraçado que uma jornalista que é boa em comunicar, tenha tanta dificuldade de se comunicar na vida pessoal”, explica.
O hábito da leitura para Alessandra começou ainda na infância, quando o pai ia às bancas de jornais e comprava revistas em quadrinhos para ela. “Eu lia, na infância, Turma da Mônica, as revistas de fofoca e guardava tudo em um espaço lá de casa, nos armários. Conforme fui crescendo fui me afastando completamente da leitura por prazer, comecei a ler porque o colégio mandava, lia bastante, primeiro para o colégio, depois para vestibular e para a faculdade”, diz.
“Quando veio a pandemia, eu cumpri bastante o isolamento social. E aí comecei a sentir necessidade de sair daquele lugar, pelo menos na cabeça, com a imaginação. Comecei a comprar livros, que não era uma coisa que eu tinha costume depois de mais velha. Acho que o primeiro que comprei nesse processo foi um de Paulo Freire e aquilo me encantou, eu descobri o prazer na leitura e comecei a comprar cada vez mais livros”, conta.
“Mas quando você começa a ler muito, vai dando uma vontade de escrever também. Não sei se isso é com todo mundo, mas eu senti isso em mim. Então eu queria copiar um pouquinho daquelas coisas que eu via e causar aquelas emoções que eu estava sentindo quando eu estava lendo”, revela.
Relação com o pai
Quando o pai de Alessandra foi diagnosticado com o mal de Alzheimer, ela tinha entre 13 a 14 anos. “Ele foi diagnosticado muito precocemente, aos 55 anos, normalmente é uma doença que atinge as pessoas aos 80 anos ou mais. Então, eu tinha 13 ou 14 anos na época. Anos antes do diagnóstico, ele já vinha apresentando alguns sinais. Eu era uma criança, mas já tinha essa consciência de que algo não estava normal”, relata.
Segundo Alessandra, a sua família reproduzia os conceitos patriarcais, o que criou uma barreira afetiva entre ela e o pai. “Painho tinha a última palavra. Para você ter uma noção, só podíamos comer se ele sentasse na mesa. Caso ele não tivesse chegado, a gente precisava esperar. Ele era uma pessoa, muitas vezes, grosseira, tinha seus momentos de violência conosco. Então, ele era um pai muito distante emocionalmente para a gente”, rememora.
“Quando vem a doença dele, virou tudo de cabeça para baixo, porque a pessoa tem Alzheimer, ela não consegue se gerir, controlar suas finanças, não consegue manter compromissos, trabalhar. Meu pai perdeu essa figura que ele era lá de casa, central, que comandava as coisas. E aí o engraçado é que foi quando fui me aproximando mais do meu pai. Então, ele foi perdendo várias capacidades, ele foi se abrindo, se tornando mais aberto, menos fechado e mais carinhoso”, conta.
Com a pandemia da covid-19, Alessandra voltou para a casa dos pais, em Feira de Santana, e passou a ajudar nos cuidados com o pai. Ela conta que o cuidado com o genitor foi feito junto à mãe e às irmãs e que o processo foi fundamental para reatar os laços com o pai, que faleceu em novembro de 2023. “Foi nesse processo de cuidado, que eu me senti verdadeiramente próximo ao meu pai, foi quando criamos intimidade, porque era algo totalmente impensado com ele antes”, diz.
Neste processo de cuidado, Alessandra começou a escrever o livro conforme foi ganhando intimidade com o pai. Ela conta que já havia a intenção de escrever sobre suas memórias, trabalho que foi iniciado em textos publicados no Medium, anos antes da publicação de seu livro.
“Foi quando eu vi de verdade esse lado amoroso dele e gentil, e aí me deu uma vontade de colocar isso no papel de dizer assim que as pessoas mudam e que as coisas e que as coisas mais trágicas que acontecem podem ser também bonitas. Podem ter vieses, perspectivas e momentos de beleza, e acho isso tão bonito, eu acho que a forma como vejo a vida hoje é muito mais bonita”, finaliza.