
Nos últimos anos, a expressão “economia do conhecimento” tem ganhado espaço nas discussões sobre o futuro do trabalho, inovação e desenvolvimento. Mas há uma pergunta incômoda que o Brasil insiste em não responder: de quem é o conhecimento que está sendo valorizado?
Em um país onde pessoas negras representam a maioria da população, é chocante perceber que seus saberes, pesquisas e criações intelectuais seguem à margem dos centros de poder e da economia formal. Ainda hoje, no século XXI, a produção intelectual negra — em especial nas áreas da economia, das finanças e das ciências sociais — é tratada como periférica, acessória ou “militante”. E isso tem consequências graves.
O racismo epistêmico não é um detalhe. Ele molda o que se entende como válido no debate econômico nacional. Ao ignorar a inteligência negra, o Brasil perde mais do que diversidade: perde inovação, perde soluções criativas para problemas complexos, perde a chance de construir um modelo de desenvolvimento enraizado em justiça social.
É por isso que precisamos falar sobre empreendedorismo intelectual negro.
Empreender intelectualmente é pautar o conhecimento de pessoas negras que pesquisam, escrevem, pensam, ensinam, codificam saberes e constroem tecnologias sociais — mas que raramente têm acesso a editais, incubadoras, investimentos ou reconhecimento institucional. É o pensador negro que traduz sua tese em metodologia; é a economista negra que cria uma abordagem sobre consumo periférico; é o educador de terreiro que desenvolve uma pedagogia afrocentrada.
Esse é o tipo de produção que poderia — e deveria — estar na base de novos negócios, políticas públicas, materiais didáticos, sistemas de consultoria e plataformas educacionais. Mas sem infraestrutura, incentivo ou mecanismos de monetização, esse conhecimento vira mais um talento desperdiçado. E o Brasil segue sem rumo.
Se o Estado se ausenta e o mercado fecha as portas, quem pode abrir caminhos?
A resposta passa por iniciativas como o Fundo Agbara, o primeiro fundo filantrópico para mulheres negras no Brasil, e por plataformas como o Mercafro, que atua para dar visibilidade e transformar saberes negros em valor social e econômico.
A proposta é simples, mas revolucionária: a produção intelectual negra é um ativo estratégico.
Não é um favor, nem uma cota simbólica — é um elemento central para construir um país mais inclusivo, ético e competitivo.
O que o Brasil ganha com isso? A resposta pode soar utópica, mas é prática:
Ao investir no empreendedorismo intelectual negro, criamos oportunidades de autoemprego qualificado, promovemos o desenvolvimento local com base em saberes próprios, e reposicionamos o Brasil no cenário global como um polo de inovação plural.
Além disso, fortalecemos um ecossistema de pensamento que não apenas resiste, mas propõe, reinventa e lidera. Porque não há transformação real sem quem historicamente foi silenciado.
É hora de o Brasil reconhecer: o futuro também é preto — e pensa alto.
OPINIÃO
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