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Meu AirBnB, minha vida: a uberização da habitação

O famigerado café da manhã de hotel agora enfrenta um forte concorrente na experiência de viagens. O conforto de uma casa, contato direto com os proprietários e locações mais inusitadas estão botando a suntuosidade de banquete matinal dos hotéis de lado. Mesmo saindo tudo no seis por meia dúzia no assunto dos valores gastos, escolher hospedagens particulares via aplicativos tá sendo a pedida. Agora, com a mesma facilidade que se reserva um loft moderninho em alguns cliques, cidades vêm se preocupando com inflação da especulação imobiliária e segurança de turistas e até um pouco com a seguridade social da população.

Que viagem é o momento de ficar de boa, todo mundo sabe. Mas a moeda que era gasta pra bancar serviço de quarto e cafezão, agora é usada para promover experiências de morar e vivências mais práticas na hora de conhecer uma cidade nova. Dos primeiros sites de comparação de preços até apps de aluguel temporário, várias foram as estratégias de plataformas digitais para manter o setor de hotelaria ativo. Mesmo que o velho hotel ainda esteja firme e forte na linha mais tradicional, boa parte de seus usuários atuais são daqueles que não conseguiram reservar um Airbnb a tempo. Alugar um quarto, ou até mesmo casa, por um período de tempo ficou tão popular que todo um novo mercado de aluguéis por temporada, com plataformas, networks de divulgação, criadores de conteúdo e arquitetos especializados, todos centrados em manter e promover a comunidade do aluguel por aplicativo.

Perfis como o Achados do AirBnB exploram as hospedagens por temporadas mais interessantes.

Nessa onda de hospedagem digital, assim como várias arquiteturas incríveis, porém desconhecidas, é possível alugar o sobrado do Alceu Valença em Olinda ou o apartamento do influencer Caio Braz no Copan, ícone do arquiteto Oscar Niemeyer na capital paulista.

Hospedagens nada convencionais direto no seu celular.

Na verdade, há vários apartamentos nesse mesmo edifício, a ponto de criarem um portal apenas para coordenar essas unidades na plataforma do AirBnB. O negócio digital, baseado na plataforma de hospedagens vingou tanto que ganhou escritório no térreo do clássico edifício para serviços e atendimentos a hóspedes e interessados. Empreender nesse ramo de hospedagem inovadora virou uma oportunidade pra quem achava que comprar terreno era o segredo; a quantidade de conteúdos sobre kitnets, casa-container e afins, tudo com o intuito de aluguel, no YouTube pode deixar o leitor empreendedor entretido por um bom tempo.

O perfil AirBnB no Copan conta com diversas unidades e até serviço de apoio exclusivo.

Mas, se não faltam sobrados incríveis ou kitnets super práticas na plataforma de hospedagem, falta muito lugar para morar no Brasil. Aqui, desde a década de 70, quando a população urbana ultrapassou a população do campo, tem uma condição nada tecnológica, mas muito séria, que deixa em vulnerabilidade boa parte da população de baixa renda que, provavelmente, é quem construiu as locações hypadas da plataforma de hospedagem. Enquanto projetos como o Pedregulho no Rio de Janeiro e os Cohabs ao redor do país são deixados de lado, a habitação perde seu principal interesse, o social, e passa a ser artigo turístico. Similar ao paradigma do congestionamento, que comentei na coluna anterior e você pode clicar aqui para ler, a chance de dar beyblade na questão da habitação também aumenta por causa de plataformas de hospedagens particulares.

É claro que o caldo ia engrossar também na parte das leis. Tem quem entenda do Direito e diga que o que esses aluguéis fazem seja sublocação, forma de uso da moradia proibida em diversos países, inclusive no Brasil. E como não faltam relatos de insegurança, como câmeras escondidas e equipamentos de segurança sem manutenção, governos locais têm alertado para a relativa segurança das hospedagens tradicionais, que pagam impostos (e não deve ser pouco). Há poucas semanas, a cidade de Nova York proibiu os aluguéis de curta duração, permitindo apenas em condições tão esquisitas que vale mais a pena voltar pro velho hotel (que pelo menos tem mini frasco de shampoo de brinde).

E, na real, se já houve quem desistisse do clássico sonho do carro próprio para usar carro por aplicativo, vai haver quem abdique de um certo conforto do setor hoteleiro para ter uma experiência de viagem mais enriquecida; as opções são diversas e incríveis. Agora, não custa olhar um pouco do lado e entender o impacto social que esse catálogo tão extenso pode provocar; se toda moradia for virar um lugar moderninho pra alugar, não tem santo que aguente, vai acabar tendo governo metendo a mão, invisível ou não, na tributação e nas restrições legais. Viajar e ficar de boa todo mundo gosta, mas casa pra todos é melhor ainda e tá na Constituição e na ONU.

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