Reportagem do portal Umbu entrevistou o presidente da ABI, Ernesto Marques e a vice-presidente do Sinjorba, Fernanda Gama

Neste domingo (7), é comemorado o Dia do Jornalista, data reservada para celebrar o trabalho feito pela imprensa. O Dia do Jornalista foi instituído há 93 anos, em 1931 pela Associação Brasileira de Imprensa (ABI), como homenagem ao médico e jornalista Giovanni Batista Líbero Badaró.
Segundo o Brasil Escola, do UOL, Líbero Badaró era um oposicionista ao governo do imperador D. Pedro I. O jornalista foi idealizador do Observatório Constitucional, um jornal independente que tratava de temas políticos que eram censurados por D. Pedro I. Ainda de acordo com o título, Badaró defendia uma imprensa livre e, em 1830, foi assassinado por seus ideais que contrariavam os interesses dos poderosos.
Badaró foi morto pelo simples fato de exercer a sua profissão, uma vez que é responsabilidade do jornalismo fiscalizar e cobrar o poder. É função do jornalista, apurar e checar informações, coletar materiais e dados, analisar fatos, entrevistar fontes e levar esse conteúdo em formato de notícia, matéria, reportagem e artigos.
É trabalho ainda do jornalista, buscar traduzir conteúdos da maneira mais clara e objetiva a toda a população, para que a mesma, munida de informações possa formar a sua opinião sobre determinado assunto. Os profissionais da imprensa são responsáveis por fotografar a história de seu tempo, além de antecipar tendências e movimentos da sociedade e de políticos.
Ernesto Marques
Para celebrar este dia, a nossa reportagem conversou com o presidente da Associação Baiana de Imprensa (ABI), Ernesto Marques, que é radialista e jornalista. Marques já atuou como repórter e na imprensa sindical. Em entrevista ao Portal Umbu, o presidente da ABI, traçou uma fotografia sobre o momento atual do jornalismo.
“Ela [a profissão de jornalista] está sempre mudando e transformando. Sou de uma geração que ainda encontrou as máquinas de escrever nas redações, que ainda cobriu eleições com voto impresso, que ainda cobriu montando aqueles sistemas de apuração paralela. Essa minha geração – eu estou com 56 anos de idade e 38 de produção -, viu a chegada da tecnologia digital”, conta.
Segundo Ernesto Marques, com a entrada da tecnologia de trabalho, houve uma mudança na forma de se fazer jornalismo. No entanto, na visão do jornalista, os desafios éticos continuam os mesmos. Um fator marcante que chama a atenção do jornalista foi quando, em 2009, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, entendeu que não era necessário o diploma para o exercício da profissão de jornalista.
“Isso talvez tenha sido o fato mais impactante que causou uma mudança que ainda está em processo, mas resultou no processo de precarização das relações de trabalho, de redução da média salarial dos jornalistas, de perdas de garantias, entre outros”, diz.
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Hoje, há um movimento amplo de entidades representativas dos jornalistas para que a obrigatoriedade do diploma para o exercício da profissão seja retomada. Por isso existe uma priorização para que a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 2026/2012, a chamada PEC do Diploma, avance com brevidade.
“A partir do momento em que você não tem mais aquele caminho, que todos nós trilhamos, que era uns quatro anos, pelo menos, de vivência acadêmica e de preparação, um lastro intelectual que a gente construía, isso também se reflete na forma como os jornalistas se relacionam entre si nas redações e se vinculam também. Como a categoria se agrega em torno de uma instituição como a ABI, que é mais um guarda-chuva que contenta também empresários e dirigentes de comunicação, ela [a ABI] não trata dos conflitos entre capital e trabalho, o sindicato é diferente, o sindicato existe exatamente para isso”, continua Ernesto.
Dentro do leque de desafios da profissão, o acesso a Inteligência Artificial como, por exemplo, o Chat GPT, que produz textos, pode ser um desafio para a profissão. Sobre os riscos dessas novas tecnologia, Ernesto Marques diz: “Não adianta a gente ficar assustado, por conta da ameaça que já está colocada. Os robôs estão nas redações, isso não é exatamente uma novidade, a gente já fala isso há algum tempo”, revela.
“Na última Olimpíada já houve redação usando robôs para produzir textos mais simples e é evidente que essas ferramentas vão aprendendo cada vez mais, quanto mais a gente usa, mais a gente ensina esses mecanismos a aperfeiçoarem seu texto”, explica.
O presidente da ABI critica ainda a prática das reportagens feitas remotamente. Para o jornalista, é preciso que os repórteres vivenciem as ruas para exercerem o trabalho com excelência.
“Agora, eu acho que a gente comete quase um suicídio profissional quando a gente aceita, muito passivamente, que se torne desnecessário fazer reportagem. Não acredito que se possa fazer à distância a reportagem. Você vai onde a notícia aconteceu ou onde o fato aconteceu. Não dá para a gente fazer reportagem de dentro da redação, trabalhando remotamente, em algum escritório. Muita coisa, evidentemente, pode se fazer dessa forma, mas é a vida real, os acontecimentos da vida real, eles não permitem esse tipo de mediação”, diz.
“A reportagem, para mim, é a mais nobre, mais excitante e mais emocionante que tem entre todas as jornalismo. Fui repórter nos primeiros anos da minha carreira profissional. Já não faço reportagem há muito tempo, tenho muita saudade. Reportagem é uma coisa que pede juventude, eu ainda não sou um velho, mas é evidente que eu já não tenho a idade ideal. Eu não teria nenhum problema, ainda me sinto em plena condições de fazer isso, mas é lógico que determinadas coberturas até o vigor físico é exigido”, analisa.
Fernanda Gama
Vice-presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado da Bahia (Sinjorba) e vice-presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) na Bahia e em outros 3 estados da Região Nordeste, a jornalista Fernanda Gama também conversou com a reportagem do Portal Umbu.
Atuando através dessas instituições, Gama acompanha reivindicações da categoria e acaba tendo uma visão detalhada dos desafios da classe. Assim como Ernesto, Gama acredita que a retirada da obrigatoriedade do diploma pelo Supremo para o exercício da profissão, deixou os jornalistas em uma situação precária.
“Nossa carga horária, mesmo sendo lei, não é respeitada por muitos gestores. Não temos um piso salarial e um protocolo de segurança nas empresas, para tratar casos como o de Samara”. Samara Figueiredo, jornalista da Rede Bahia, foi vítima de agressões verbais e ameaças no último domingo (31), enquanto realizava a cobertura da primeira partida entre Bahia e Vitória pela final do Campeonato Baiano, no Barradão.
A jornalista foi alvo de insultos misóginos e gestos obscenos depois que alguns torcedores do rubro-negro tentaram quebrar o vidro de proteção da cabine onde estava o produtor de conteúdo da ECB TV, Antônio Neto. Conforme publicado pelo Sinjorba, os agressores ainda jogaram um copo de cerveja em Samara e disseram que ela não deveria estar no estádio, pois “ali não é lugar de mulher” e que ela deveria estar “dormindo com alguém” para ocupar a posição que desempenhava. A Polícia Militar precisou intervir.
“Mas todos esses pontos estão na pauta de reivindicações do Sinjorba que, junto com a Fenaj, também lançou a Campanha Salarial Nacional dos Jornalistas. Mais do que reclamar, é importante que a categoria participe das ações promovidas pelo sindicato e fortaleça essa luta, que é de todos nós”, explica Fernanda.
“É necessário que as empresas privadas e os órgãos públicos respeitem nossos direitos, a exemplo da jornada especial de trabalho de 5 horas diárias (com limite de 7h quando houver acordo de acréscimo salarial) e a regulamentação profissional, que define as atribuições exclusivas de jornalistas, mas que muitas vezes são usurpadas por outras profissões da comunicação e por pessoas completamente alheias ao setor”, complementa.
O assédio e a insegurança sofridos por jornalistas também é uma dificuldade que necessita ser enfrentada.
“O Sinjorba, em parceria com a ABI-BA, criou a Rede de Combate à Violência contra a Imprensa, com o objetivo de criar políticas de prevenção a agressões contra jornalistas e estabelecer protocolos que garantam o combate e a punição dos agressores. A Rede conta com o apoio das polícias Civil e Militar, a Defensoria Pública do Estado, a Secretaria da Justiça e Direitos Humanos da Bahia, Ministério Público Estadual e OAB-BA. Além disso, em nossa pauta de reivindicações solicitamos que as empresas implementem um Protocolo de Segurança para o jornalista. Mas também precisamos que os profissionais, vítimas desse tipo de crime, denunciem aos órgãos competentes”, diz.
Recentemente, a tabela de preços para serviços prestados por profissionais da imprensa, antes disponível no site do Sinjorba, foi retirada do ar sob acusação de formação de cartel. Questionada sobre como isso impacta negativamente na segurança econômica e profissional da categoria. Fernanda Gama, explica:
“Nossa tabela nunca foi impositiva e sim uma sugestão para os profissionais que estão no mercado de trabalho. Não são valores mínimos a serem cobrados, ou “cartel”, como alega o CADE. São referências para uma categoria que, hoje, é majoritariamente freelancer, trabalhando de maneira autônoma e sem uma convenção coletiva que lhe preserve mínimos direitos. E isso em um mercado que foi invadido por pessoas sem formação, que obtiveram o registro profissional com base numa absurda decisão do Supremo Tribunal Federal.”
“Esse tipo de processo, que incentiva o enfraquecimento da organização dos trabalhadores, segue a cartilha neoliberal da livre negociação, que impõe ao mais fraco negociar com o mais forte sem nenhuma salvaguarda”, pontua.
O mercado de trabalho da comunicação pode ser descrito como “competitivo” e difícil de ingressar. A jornalista acredita que um dos caminhos para driblar esses obstáculos é o estudo. “Continuar estudando e se capacitando. Muitos estudantes entram na faculdade com a ideia de trabalhar em veículos de comunicação, mas o jornalismo vai muito além disso. Conheça outras áreas, estude sobre elas e busque uma especialização”, finaliza.