
Embora não seja um fã do Big Brother Brasil, tenho que admitir que meu amigo jornalista Maurício Pestana, da Revista Raça, tem razão, ao afirmar que: “Observando com um pouco mais de atenção os personagens do programa, percebemos um retrato fiel e sem distorções da nossa população em sua maioria: muito compromisso com a estética corporal e social exacerbado em redes sociais, com pouco compromisso político ou social”.
A vitória de Davi Brito nesta última edição do BBB e as celebrações no bairro de Cajazeiras, aqui em Salvador, autodenominado pela população local de Cajacity, só perderam, em entusiasmo, para a festa da vitória da seleção brasileira na Copa do Mundo.
O povão gritou, vibrou e festejou até a madrugada, a vitória desse rapaz ousado e determinado, sentindo-se representado por este jovem negro e pobre de Salvador que enfrentou toda sorte de armadilhas e discriminações, até mesmo daqueles que, hipoteticamente, seriam seus aliados.
Aliás, é a primeira vez que um homem negro retinto vence o BBB.
Exatamente, por ser “um retrato fiel e sem distorções da nossa população” é que esse fato merece algumas reflexões.
A vitória do Davi, nesse momento disfuncional em que se encontra a sociedade brasileira, funciona como um gatilho para afirmar e coroar o esforço, a esperteza e a sabedoria individual, em saber jogar num campo minado e sair vencedor, como única alternativa para os excluídos.
É, na verdade, o culto pleno a persona individual, no qual o “querer é poder”.
Claro que o jovem Davi Brito é merecedor. Claro que a comunidade de Cajazeiras merece ter o seu ídolo celebrado. Mas também, é claro que Davi é exceção em meio a regra geral da pobreza e da miséria a que está condenada a maioria da juventude negra brasileira.
Talvez, por isso mesmo, sonho com o dia em que celebrações como estas que Davi e seus vizinhos estão fazendo possam resultar, por exemplo, na melhoria das condições de vida daquele bairro/cidade, que apesar de possuir quase 800 mil moradores não possui um único equipamento cultural dos poderes públicos, apesar de lutar há anos por um Centro de Cultura.
Quando vi a alegria daquele povo, lembrei-me das duas edições do Flin – Festival Literário Nacional, realizadas durante minha gestão à frente da Fundação Pedro Calmon, que foram realizados em Cajacity.
Esse Festival, que marcou a juventude daquele bairro e que contou com a presença entusiasmada de mais de 10 mil pessoas em cada um deles, além de artistas e grupos como o Marcela Guedes e o Samba Ohana, Slam das Minas, Grupo Jaca, Wendel Junior, Eduardo Luz, foi um sonho transformado em realidade.
Lembrei-me de Itamar Vieira Junior, também originário de lá e que faz sucesso mundo afora com o seu “Torto Arado” que vem dando certo.
Enfim, que Davi, o vencedor do BBB 24, faça do seu sucesso e da sua tenacidade mais uma janela de oportunidade para que juventude negra de Cajacity brilhe mundo afora.
Toca a zabumba que a terra é nossa!
Belo texto