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“Acho que as pessoas precisam ser felizes como elas são”, reflete a cantora Aila Menezes sobre a ditadura da magreza

Em entrevista ao portal Umbu, Aila relata os desafios de ser uma mulher no pagode, fala da importância de lutar contra a gordofobia e revela os planos para o futuro

O contato com a arte chegou na vida da cantora Aila Menezes muito cedo. Com uma família de artistas, o avô palhaço e a mãe cantora, Menezes viu no fazer artístico uma profissão e um meio de se expressar. Antes de começar na música, estudou Balé Clássico e, aos 7 anos, durante um karaokê na escola, a artista teve a certeza de que iria ser cantora.

A cantora participou em 2013 do reality show “The Voice Brasil”, da Rede Globo. De lá para cá, Menezes lançou diversas músicas e se firmou como uma voz que luta contra as pressões estéticas sofridas por mulheres. A artista já fez feats com nomes importantes da música como as cantoras Daniela Mercury e Preta Gil. Em seu trabalho mais recente, “Pagode Latino”, vem levantando bandeiras necessárias como a presença da mulher no pagode e a latinidade.

Em entrevista à reportagem do portal Umbu, a cantora Aila Menezes relata os desafios de ser uma mulher cantando pagode, analisa a importância de levantar a voz contra as opressões estéticas e revela os planos para o futuro. Confira:

Portal Umbu: Quem é Aila Menezes?

Aila Menezes é filha de Verônica e Luciano, irmã de Maira e mamãe de Vida. Um ser humano que busca evoluir, que busca encontrar sua melhor versão. Eu sou um montante de conquistas, eu sou um montante de lágrimas, de histórias. Eu acho que não existe nada estável. Então eu estou Aila Menezes, cantora, bailarina e tantas outras coisas diversas que me compõem. Mas eu estou Aila Menezes.

Portal Umbu: Como uma mulher na cena do pagode, quais foram os principais desafios para conseguir se firmar na cena musical?

Desde muito criança, desde muito nova, eu sempre notei minha aptidão para arte. Na verdade, eu já nasci numa família muito artística, meu avô é o palhaço mais antigo do mundo, o palhaço Pinduca, que faleceu em 2016. Então a minha vida sempre foi muito cheia de arte. Eu iniciei na dança, no ballet clássico e logo depois no karaokê de um colégio que eu estudava, aos 7 anos eu cantei pela primeira vez e entendi que eu queria realmente ser artista. 

Desde muito pequenininha – tem vídeos pequenos -, minha mãe sempre gravou coisas minhas. Eu sempre tive muita certeza, nunca foi um teste de vocação, eu nunca fiz teste de vocação na vida, eu já sabia, desde muito cedo, o que eu queria mesmo. Então foi investir, aprender, estudar, respeitar o tempo de ser criança, de estudar, de ser jovem, de fazer outras coisas para conseguir depois me tornar profissionalmente cantora. Então eu, com 12 anos, já tinha uma banda de pessoas que se juntavam, de colegas, de amigos de escola, nada muito profissional. Isso só foi avançando, crescendo e criando o meu currículo como cantora.

Portal Umbu: Como uma mulher na cena do pagode, quais foram os principais desafios para conseguir se firmar na cena musical?

Ser mulher no pagode já é um grande desafio. Então existem desafios a mais, além de ser mulher no pagode. Tudo, na verdade, sendo mulher, é um desafio. Encontrar espaços, encontrar oportunidades, encontrar pessoas que acreditem em você, no seu ritmo, encontrar respeito, principalmente com relação aos homens. A gente vive também muitas questões relacionadas a assédio. 

São muitas camadas, são muitos recortes. Ser mulher no pagode, ser mulher na vida já é muito difícil. Ser mulher no pagode, onde é um ritmo majoritariamente masculino, machista, misógino. Onde sempre, nós, mulheres, estivemos como coadjuvantes, como não-artistas, como não-protagonistas dessa história. A gente chega, bota uma bandeira e diz: Cheguei aqui, quero respeito e mereço espaço.

É uma série de dificuldades, de uma pirâmide que está aí e que amarra todas nós, mulheres, para que a gente não caminhe, para que a gente não vigore. E é contrariar todos os dias as estatísticas, os planejamentos e o que a sociedade diz pra gente o que fazer. É bem sofrido, mas quando a gente sobe no palco e grava músicas, sentimos o carinho das pessoas e outras mulheres vão arrebentando as correntes que aprisionam elas, a gente entende que vale muito a pena.

Portal Umbu: Entre suas composições, a positividade corporal é um tema recorrente. Em “Fat Gata, Gata Gorda” você critica a ditadura da magreza. Qual a importância de trazer temas como esse na sua obra?

Então “Fat Gata” foi construída, foi feita exatamente para que fosse um grito de liberdade. Uma música que a gente pudesse cantar sem medo de sermos felizes, de ser quem somos. Até então eu nunca tinha escutado músicas que celebrassem corpos que não fossem os ditos da academia, magrinhas, chapadonas de barriga e coisas e tal. Então eu queria uma música que retratasse a minha realidade e a realidade da maioria das mulheres do Brasil, porque nós mulheres curves e gordas somos mais da maioria da população. 

Então precisa existir nos lugares, espaço pra gente, precisam falar de nós, precisam entender que existe uma diversidade de corpos, de pessoas. Não sou, nunca fui, nunca serei a favor da ditadura da magreza, nem de nenhuma ditadura e me recuso a me dobrar a qualquer ditadura. Eu acho que as pessoas precisam ser felizes como elas são, com o corpo que elas têm, se daí elas quiserem mudar algo, fazer algo a mais, ok, mas a gente precisa ser livre para que nosso corpo seja o templo que a gente mora. A gente vai morar aqui nesse corpo até a gente morrer.

Logo, todos os corpos contam uma história, as estrias, as celulites, isso nos faz femininas de verdade, então eu sou contra qualquer tipo de ditadura e estou aqui pra cantar todas as coisas que liberte outras mulheres, que aumente a autoestima de outras mulheres e que convide outras mulheres a refletir sobre como ser diferente também é ser gostosa, potente, sedutora e tudo mais.

Portal Umbu: Seu último álbum, Pagode Latino (2023), trouxe bandeiras importantes como latinidade e a presença da mulher no pagode. O que o público pode esperar dos seus próximos trabalhos?

A latinidade é algo que me representa muito, que eu acho que antes de eu chegar, a minha latinidade chega no meu lugar. Então o “Pagode Latino” não é nem sobre o álbum “Pagode Latino”, é sobre o meu estilo, é sobre quem sou, sobre a mulher latina que sou, sobre a quantidade de coisas que a latinidade traz, étnicas, culturais, etc.

Então o Pagode Latino é a porta de entrada, digamos assim, para quem é Aila hoje, para a ‘ritmia’ que eu escolhi, para além do pagodão, a minha latinidade que me leva assim pro mundo, pros outros lugares e como gosto de ser vista como uma mulher latina. 

Vocês podem esperar nos próximos trabalhos muita latinidade, originalidade, sempre enaltecendo e falando dos lugares que nós, mulheres, podemos percorrer e alcançar. E acho que mistura de ritmos, eu gosto muito de brincar com a mistura de ritmos, ser ousada mesmo e fazer coisas que ainda não foram feitas, misturar instrumentos que ninguém nunca viu e colocar no pagodão. 

Então eu acho que vocês podem aguardar novidade. Eu sou um poço de inquietação, então não dá nem para dizer assim, aguardem tal coisa, porque, muitas vezes, no meio do caminho, eu sou surpreendida por minhas ideias e tudo que estava planejado para acontecer já não acontece e acontece de outra forma. Mas eu acho que vocês podem esperar de mim sempre o que não for orgânico, sempre o que não for possível, sempre o que não é comum. Eu acho que é isso que vocês podem esperar, música boa, de qualidade no sentido de diversidade rítmica, no sentido de compromisso com a música e representatividade feminina.

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