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“Acabou o drama, Os Paralamas. Os óculos agora estão daquele jeito”

Em 1984, a Apple lançou o primeiro Macintosh, pioneiro da linha avassaladora de computadores da empresa, e os Paralamas do Sucesso lançavam a música “Óculos”. Se Hebert Vianna e companhia, na época, ficavam de calundu porque as meninas do Leblon não olhavam pra eles, a empresa da maçã está querendo botar todo mundo pra usar óculos e, segundo eles, enxergar a realidade muito melhor. Numa mistura de real, virtual, óculos e mais óculos, hoje a interação com o computador está riquíssima. Cada vez mais novos termos aparecem. Da última vez falamos de entrar totalmente no ambiente, o tal do metaverso e a realidade virtual (VR); dessa vez a gente vai fazer uma baguncinha e trazer o virtual misturado com a realidade, a tal da realidade aumentada (AR).

Anunciado há poucos dias, a Apple tenta, mais uma vez, estabelecer uma tendência de mercado com um dispositivo de enriquecimento da realidade pra lá de, digamos, surpreendente, o Apple Vision Pro. Duas telas melhores que 4K, pra cada olho, alto-falantes direcionais e uma penca de sensores de ponta integram real e virtual e permitindo que tarefas, antes feitas na tela de um computador, se misturem ao ambiente e cotidiano, já que, mesmo com tudo isso, ainda é possível enxergar através das lentes (tanto quem usa, quanto quem vê quem está usando). Agora, se usar um trambolho fumê tampando toda a cara e, ainda por cima, com fio pra conectar a bateria (que é externa), ainda não é esquisito o suficiente, pense que o será preciso desembolsar US$ 3.499 pra ficar com esse visu cyberpunk da maçã.

Um workspace inteiro na sua sala de estar. (Imagem: Reprodução/Apple)

Talvez em casa, de keké, lançar um óculos desse e imergir num filme ou jogo seja uma coisa indescritível; não à toa, é o que mais se retrata no filme de lançamento que a Apple fez para o produto. Mas foi essa característica de isolamento que Mark Zuckerberg, aquele que queria jogar todo mundo no metaverso, usou pra fazer a caveira do lançamento da Apple. A proporção do aparelho no rosto, e principalmente, o sistema operacional focado em apps individuais foram as principais cartadas do CEO da Meta para promover a sua versão do produto, o Meta Quest 3; além do preço mais razoável (US$ 399), ele promete ser mais integrador (o que me cheira muito a metaverso embutido nos óculos). Venhamos e convenhamos, a estética é tão robocop quanto o concorrente e o arrependimento pelas críticas ao pioneiro Google Glass vem forte. Esse último apareceu no mercado lá em 2014, mas, sendo direto, deu com os burros n’água por ser limitado em funcionalidades e causar problemas de orientação aos usuários. Quase 10 anos depois, é que o mercado volta a se reanimar.

Porém a realidade aumentada não se restringe a óculos, não. Antes de toda a parafernalha de alta tecnologia, tinha muita gente capturando Pokémon em praça de shopping ou na fila do acarajé. A nostalgia dos jovens adultos promovida pelo jogo mobile Pokémon Go!, lançado em 2016, tinha parte do seu encanto garantida pela possibilidade de ver os bichinhos através da imagem da câmera do celular; sim, encontrar um bulbassauro virtual no Jardim Zoológico também é realidade aumentada! A lista de formas de entretenimento que usam a AR ainda vão além das telas convencionais, com mesas de sinuca que transformam qualquer num Baianinho de Mauá, já que elas projetam em, tempo real, na própria mesa, a trajetória que as bolas farão de acordo com a direção da tacada.

Já se você buscou imóveis de uns 8 anos pra cá, alguém, provavelmente te entregaram um QR Code para você visualizar a fachada ou planta de um novo empreendimento, bastando apontar a câmera do celular. Mais simples ainda que as aplicações anteriores, sem sensor algum, apenas processando a imagem de um QR Code específico, apps de construtoras e de arquitetos hypados conseguiam dar uma visão 360 de maquetes virtuais. Enquanto que muitos se queixavam de lentidão e aquecimento do aparelho para jogar o Pokémon Go!, nesta solução, qualquer câmera de poucos megapixels executava bem a missão. A estratégia, de tão simples e útil, foi adotada em peso pela área de decoração e grandes lojas te permitem testar seus móveis sem sair de casa.

E se a gente for falar de pesquisa acadêmica, então, esse papo é mais estabelecido que caruru na sexta-feira. Aquele mesmo Ivan Sutherland, que falei na coluna passada, trouxe à tona, lá pelos EUA ainda na década de 60, o que seria a nossa realidade aumentada de hoje. Ficando mais perto, em tempo e distância, ali em Ondina, o Grupo de Computação Visual do recém emancipado Instituto de Computação da UFBA conta com doutores (dos que tem doutorado mesmo) especialistas na área desenvolvendo e orientando há anos trabalhos de graduação, dissertações de mestrado e teses de doutorado de altíssima qualidade e respaldo científico.

Assim, do simples joguinho de celular ao rebuscado equipamento de imersão mista, o ponto em comum, que é a tendência do momento é, ter nossa realidade física complementada por dados digitais. Entre o totalmente real e o totalmente virtual, há um espectro amplo, com diversos níveis de interação entre o que podemos realmente tocar e produzir naturalmente e o que só vemos ou produzimos por meios digitais.

Espectro de possibilidade de junção entre realidades virtuais e físicas. (Imagem: Reprodução/Research)

A real é, vai dar pra continuar fazendo a linha Paralamas do Sucesso e reclamando dos óculos, nem tiro a razão, são esquisitos, ainda estão pouco humanizados e nem todo mundo é da Fratelli Vita pra bancar um equipamento desse custo. Mas pegar a visão de como a realidade mista, digital e físico juntos, pode ser um impulso de qualidade de vida é coisa pra já.

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