Na mesa “Resista, menina: a palavra que empodera”, Tia Má abordou temas como ancestralidade, memória afetiva e a urgência da representatividade desde a infância

Na segunda edição da FELIS – Feira Literária Internacional de Serrinha, um dos momentos mais marcantes foi a participação da jornalista, escritora e atriz Maíra Azevedo, conhecida como Tia Má, na mesa “Conversa Literária – ‘Resista, menina’: A palavra que empodera”, mediada pela educadora e pedagoga Marizete Barbosa. Com sua fala potente e afetiva, Maíra trouxe ao público reflexões sobre representatividade, ancestralidade e as feridas emocionais que atravessam gerações.
“Estar aqui é uma honra, mas também um momento profundamente emocional. É a primeira vez que venho a esta cidade, que é a terra natal da minha avó paterna, Cecília, descendente de indígenas. É como se eu estivesse voltando às minhas origens. Eu estou muito emocionada”, afirmou, visivelmente comovida.
Em sua fala, Maíra abordou o silenciamento histórico das mulheres negras no Brasil e o peso de transformar sua palavra em ferramenta de resistência. “A palavra da mulher negra sempre foi calada, distorcida. O preço que a gente paga para resistir é alto. Existe um envelhecimento emocional e psicológico porque, muitas vezes, precisamos provar o tempo inteiro nosso conhecimento, nossa dedicação e capacidade.”
Ela seguiu: “Resistir virou uma palavra comum, mas por trás dela há dor. Muitas vezes a gente adoece, chora em silêncio, se cala ou simplesmente não vai. Mas eu entendo que não estou sozinha. Sou fruto da luta de muitas mulheres pretas que vieram antes de mim e não tiveram oportunidade de falar. Por isso, eu não posso me calar. Não posso me calar por minha avó. Não posso me calar por minha mãe, que se dedicou tanto para que eu tivesse acesso à educação.”
A autora compartilhou com o público como sua vivência materna influencia diretamente sua escrita: “Existem dois processos criativos em mim. Um é da Maíra que escreve para adultos, com base nas minhas referências bibliográficas. O outro é da mãe que escreve para os filhos. Quando a gente é mãe de crianças pretas, precisa aprender a contar de novo as nossas histórias.”

Foi nesse contexto que surgiu o livro A menina que não sabia que era bonita, obra infantil escrita, segundo ela, para curar feridas da própria infância. “Escrevi esse livro para a criança que eu fui. Na minha infância, nos anos 80, não era comum dizerem que uma criança negra era bonita. Então hoje, eu conto aos meus filhos as histórias que eu gostaria de ter escutado quando era pequena.”
Ao fim do encontro, Maíra destacou a importância de ocupar espaços como o da FELIS, onde a literatura se torna ponte entre memória, resistência e afeto. “Estar aqui é mais do que participar de um evento. É sobre reafirmar a nossa existência, sobre semear histórias e esperanças. É sobre dizer, com todas as letras, que nossa voz importa e precisa ser ouvida.”