A Manifestação, realizada por dezenas de organizações negras do estado, buscava diálogo e entrega de propostas para a Secretaria de Segurança da Bahia

Nordeste de Amaralina, Gamboa de Baixo, Tancredo Neves, Fazenda Coutos, Águas Claras, Cosme de Farias, Lobato e Pau Miúdo são bairros de Salvador (BA) marcados por um histórico de vulnerabilização e negligência estatal. Com ampla maioria de população negra, essas comunidades periféricas enfrentam diariamente a violência policial, que opera sob a lógica do racismo institucional, com atuação ostensiva e truculenta.
Foi em resposta a esse contexto que, na manhã da última sexta-feira (25), organizações dos movimentos: negros, de mulheres negras,de juventude, e de mães de vítimas do Estado realizaram um ato em frente à Secretaria Estadual de Segurança Pública, no Centro Administrativo da Bahia (CAB). A Polícia Militar barrou a entrada dos manifestantes no prédio, e a mobilização aconteceu do lado de fora.
O ato reuniu cerca de 80 pessoas, com o intuito de denunciar o massacre em curso nas periferias soteropolitanas, onde a atuação das forças policiais tem resultado em mortes sem responsabilização. Segundo o Instituto Fogo Cruzado, entre janeiro e abril de 2025, foram registradas 13 chacinas na Região Metropolitana de Salvador (RMS), sendo oito com participação direta de agentes do Estado. No total, 53 pessoas foram mortas, 38 delas por ações policiais. As vítimas incluem sete adolescentes. Salvador lidera o mapa da violência armada no país, com 11 chacinas e 47 mortos apenas neste ano.
Questionando a ausência de medidas efetivas por parte do Estado diante das chacinas nas periferias, Gabriela Ashanti, integrante do Odara – Instituto da Mulher Negra, afirmou que a política de segurança na Bahia tem operado como “uma sociedade de guerra”. Para ela, “é importante que o governador se atente para o que é os movimentos sociais têm produzido no campo da segurança pública. É conhecimento e é uma produção de saberes que pode colaborar, então não adianta ignorar os dados que são produzidos pelas instituições da sociedade civil, porque eles acabam tendo um rigor técnico maior.”
A manifestação também teve como objetivo protocolar um documento junto à Secretaria de Segurança e à Governadoria do Estado, com proposições de políticas públicas voltadas à redução da letalidade policial e à ampliação da participação social no planejamento da segurança pública. No entanto, a Polícia Militar barrou a entrada do grupo nas dependências da secretaria, impedindo que o documento fosse entregue diretamente. A mobilização seguiu do lado de fora do prédio.
Nesse cenário de denúncias às injustiças, Eliete Paraguassu, primeira vereadora quilombola da capital baiana, delata o programa de morte enfrentado pela população negra no estado. “Clamamos por justiça, por uma política de segurança pública que pense nesse projeto de morte contra o povo preto. A Bahia tem vivenciado esse projeto que precisa ser denunciado para a sociedade se levantar, se mobilizar e construir nesse país, nessa cidade e estado.”
Para Sara Sacramento, integrante da Iniciativa Negra por uma Nova Política sobre Drogas, o espaço da manifestação serve para questionar se as vidas negras, as famílias, as crianças e os adolescentes não importam para o Estado Brasileiro e para o Governo da Bahia. “Vemos nossos corpos tombando, as nossas crianças morrendo e perdendo suas infâncias para essa guerra que se instaura nos nossos territórios, a gente vê os nossos adolescentes e jovens sendo vitimados, mas não vemos uma resposta do Estado em reduzir a letalidade policial nas comunidades.”
Segundo dados do Fórum Permanente pela Redução da Letalidade Policial na Bahia, 97% das pessoas mortas por policiais em Salvador entre 2020 e 2022 eram negras. Dessas, 91% tinham entre 15 e 29 anos, e a maioria foi assassinada em bairros periféricos da capital.
Sueli Santos, integrante da Rede de Mulheres Negras da Bahia, destacou o papel das mulheres na mobilização. “Nós, mulheres negras, temos uma responsabilidade muito grande para fazer com que essa pauta seja prioridade nos movimentos sociais, na sociedade civil, e na sociedade como um todo. É impressionante como o racismo recrudesce, sendo um projeto que foi estabelecido e que se modifica no decorrer da história, mas cujo objetivo principal é nos exterminar”, ressaltou.
Durante o ato, as ativistas também reforçaram a articulação para a Marcha das Mulheres Negras por Reparação e Bem Viver, que acontecerá em novembro deste ano, em Brasília. “O Bem Viver precisa ser central nas reivindicações por justiça e dignidade”, destacou Sueli.
Entre as organizações realizadoras do ato, estão: o Afro Gabinete de Articulação Institucional e Jurídica (AGANJU); a Associação Protetora dos Desvalidos (SPD); a Casa Marielle Franco Brasil; a Coletiva Mahin; o Grupo de Mulheres do Alto das Pombas; a Iniciativa Negra por uma Nova Política sobre Drogas; o Movimento Negro Unificado da Bahia (MNU-BA); o Movimento Rolezinho das Caras Pretas; o Odara – Instituto da Mulher Negra; o Programa Direito e Relações Raciais da Universidade Federal da Bahia (PDRR-UFBA); a Rede de Mulheres Negras da Bahia; a Rede Religiosa de Matriz Africana do Subúrbio; e a Revista Afirmativa.
Informações: Odara Instituto e Revista Afirmativa