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5 dados que mostram a força da Festa de Iemanjá

Estamos na contagem regressiva para homenagear Iemanjá. A festa que acontece anualmente em 2 de fevereiro tem muitas nuances. Vamos a algumas informações sobre esta festa que a tornam ainda mais interessante.

Casa de Iemanjá no Rio Vermelho | Foto: Yasmin Cardim

Estamos na contagem regressiva para homenagear Iemanjá. A festa que acontece anualmente em 2 de fevereiro é a única no calendário de verão e nas comemorações públicas em todo o país em que uma divindade do Candomblé é homenageada de forma direta sem vinculação a uma santa ou santo católico, como ocorre com Santa Bárbara, por exemplo.

Essa celebração tem muitas nuances. Vamos a algumas informações sobre esta festa que a tornam ainda mais interessante.  

1) A homenageada no Rio Vermelho era Sant’Ana

Sant’Ana, mãe de Maria, Nossa Senhora, é a padroeira do Rio Vermelho. Conta-se que, durante a Guerra pela Independência do Brasil na Bahia, uma mulher idosa avisou à comunidade local, formada em sua maioria por pescadores que haveria um ataque dos portugueses. O aviso serviu para preparar a defesa. A senhora do aviso foi identificada como Sant’Ana, que se tornou a padroeira do bairro.

Até meados da década de 1940, o Rio Vermelho abrigava uma comunidade de pescadores e era ainda um local considerado afastado da cidade e ponto de veraneio. Os veranistas celebravam a festa da padroeira no período de dezembro a fevereiro. Vale ressaltar que as homenagens à Sant’Ana – missa e procissão – eram meio tímidas, com proeminência dos ritos secundários, como os desfiles de ternos de reis, banhos de mar à fantasia, mas principalmente o Bando Anunciador. O desfile era um acontecimento com a presença de automóveis enfeitados, o que dava protagonismo aos veranistas.

Os pescadores estavam mais à frente das atividades religiosas, mas no início da década de 1920 houve um desentendimento entre eles e um padre. Nesse período foi também quando eles resolveram apelar para a Mãe D’Água devido à falta de peixes. Para fazer de forma correta, foram em busca de uma ialorixá, Júlia Bugã, de nação ijexá. Trinta anos depois, o Presente dos Pescadores ganhou tanta proeminência que se tornou “a Festa”.

Já a Festa de Sant’Ana, na década de 1970 foi transferida para 26 de julho, o dia em que a Igreja Católica a celebra. Ah sim. São Joaquim continuou um pouco invisibilizado neste contexto soteropolitano. Pai de Nossa Senhora, ele é celebrado no mesmo dia da esposa, Sant´Ana, mas quase não é mencionado pelo povo.  No encontro entre candomblé e religiões afro-brasileiras, Sant’Ana é associada a Nanã.

Sant’Ana é padroeira do Rio Vermelho, mãe de Maria e avó de Jesus. No encontro entre candomblé e catolicismo, ela é associada a Nanã
2) A Mãe D’Água era cultuada em Monte Serrat

A denominação Iemanjá abriga as devoções a muitas divindades das águas. Sabe a belíssima canção “Lenda das Sereias”, que ganha ainda mais brilho com a voz potente de Marisa Monte: Ogunté, Marabô, Kayala, Sogba, Oloxum, Inaê, Janaína, Iemanjá? Pois é isso mesmo. A energia relacionada às águas do mar tem muitos nomes.

As contribuições para estas celebrações têm origem em diferentes civilizações africanas e europeias, com as suas sereias e ninfas. Como uma cidade cercada por águas e ofícios relacionados a elas, é natural que Salvador tenha muitas formas e pontos de celebração para estas formas de sagrado.

Antes do protagonismo do Rio Vermelho na celebração para a rainha do mar pelos pescadores da Colônia Z-1, o local de culto mais conhecido para essas divindades das águas era a “Pedra da Sereia”, em Monte Serrat. Dois elementos da pesquisa para a minha tese apontaram a importância da localidade nesse culto: uma reportagem de 1916 na qual o repórter descreve os bilhetes que foram deixados ao lado de ofertas, como um bandolim e até um carneiro – o animal mesmo -; a outra foi uma descrição sobre o presente, em 1930, com o registro de que o cortejo marítimo do Rio Vermelho  foi até Monte Serrat.  Estas informações foram encontradas em textos do jornal A Tarde.

3) Oxum recebe o Presente bem antes do amanhecer

A Festa é para a soberana do mar, mas Oxum, a Senhora das Águas Doces, é homenageada antes. Isso reforça a máxima de que todo mar tem um rio  e todo  rio tem um mar, afinal essas águas sempre se encontram. Em Salvador, a celebração para Oxum é no Dique do Tororó. Ela costumava acontecer nas primeiras horas da madrugada do dia 2 de fevereiro e com um certo clima de silêncio, afinal pouca gente sabia. Nos últimos anos a celebração tem ganhado maior visibilidade e, como as festas são dinâmicas e sua programação idem, o Presente está sendo levado para as águas bem mais cedo e ainda no dia 1º, como aconteceu no ano passado.

4) Celebração a Iemanjá virou festival religioso

Na Festa de Iemanjá se encontram ritos de candomblé, umbanda e Giros de Caboclos. Essa última manifestação tem crescido muito nos últimos dez anos. É possível ver nas areias da Praia do Rio Vermelho tendas e aglomerações onde chegam Marujos, mas também outros Caboclos, como Boiadeiro. E há ainda consagração nas águas de manifestações sobre as quais a gente não sabe muito e até sereismo ao longo do largo. O  doutor em antropologia e professor da Ufba, Roberto Albergaria, que era um especialista em culturas e suas dinâmicas, costumava dizer que a Festa de Iemanjá já havia se transformado em um grande festival religioso.  

5) O “camarotismo” e suas variações

O doutor em antropologia e professor da Ufba, Roberto Albergaria também costumava apontar como as elites baianas encontram formas de “não se misturar”. Elas sempre procuram alguma forma de estar na festa, mas mantendo a posição que signifique status elevado e demonstração de poder aquisitivo. Na Festa de Iemanjá, este elemento sempre foi muito presente. Já rolaram as feijoadas nos hotéis cinco estrelas, especialmente da região do Rio Vermelho. Há também o hábito de acompanhar o Presente nas embarcações de luxo e, por fim, as chamadas “festa de camisa”, mas de preferência com preços que deem susto até no Sultão de Brunei. Pagar dezenas de cédulas da moeda da vez em uma prato de feijoada “gourmet”, que pode ter um gosto que não chega aos pés daquela servida em São Joaquim , mas possui a assinatura de algum chef  estrelado e com diploma da  Le Cordon Bleu é, para algumas e alguns, a  forma de se sentir parte da corte de Maria Antonieta.

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