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Está difícil gostar de homens? Talvez seja “heteropessimismo” 

Você tentou voltar a paquerar homens depois de sair de uma longa relação, ou de um período mais reclusa, e se sentiu muito frustrada ao dar os primeiros passos? Isso tem nome: heteropessimismo.

Quando descobri essa expressão, lembrei na hora de um texto de uma amiga querida, que compartilho um trecho aqui – porque sei que muitas vão se identificar: 

O flerte não foi, necessariamente, um instrumento de concretização de algo, um meio pra chegar em algo ou alguém. Em relação aos homens, parece que paquerar exige uma conduta, um jogo, um uso de códigos que desconheço. Ser direta assusta e ser indireta demanda esse jogo que mencionei antes, mas isso eu não domino, não entendo e não me interessa aprender.

Paquerar homens não é como paquerar a vitrine da karblen, ou uma casinha bonitinha, ou uma planta. Todas as coisas mencionadas são objetos de desejo, mas algumas delas eu resolvo com dinheiro, se tiver ( sendo a Cher , eu resolvia isso rapidinho). Os homens, não! Pra eles vai ter sempre algo faltando, ou em excesso. Somos gordas, ou magras demais, velhas demais, peludas demais ocupadas demais, não pode ter filho, não pode ter mais de vinte e não pode ganhar mais que eles.”

Escrevendo aqui, tô começando a concluir que o problema não está em não saber paquerar, ou paquerar errado. É que os homens, os mesmos que eu cresci ouvindo que nos achavam difíceis, são impossíveis (kkkkkkkkkkkkk)! Difíceis mesmo!

Me identifico muito com a fala da minha amiga, pois, pouco tempo após terminar um casamento de muitos anos, decidi experimentar as relações casuais e o resultado foi desastroso. Havia muita mentira, joguinhos, manipulações e, mesmo eu estando mega carente e disposta a só dar uns bons amassos, o processo era tão cansativo que “broxei” ao ponto de desistir de qualquer coisa do tipo. Passei inclusive um bom tempo celibatária e, hoje, meus peguetes se resumem a beijos casuais quando saio pra dançar. Sexo? Há 4 anos sem. Por um lado é triste, mas por outro, gosto da tranquilidade de não colocar minha energia nesse ambiente chato das relações. 

E aí eu descubro essa abordagem do heteropessimismo que fala sobre “arrependimento, constrangimento e desesperança sobre a experiência hétero”. O termo foi trazido em 2019 pela escritora Asa Seresin e define um sentimento de decepção, constrangimento ou desespero com o estado das relações heterossexuais e o fato de estar em uma. Seria um sensação negativa que pode perpassar todo o processo, da paquera à relação constituída. 

Lendo material sobre o assunto, encontrei aspectos interessantes que quero dividir com vocês:

O heteropessimismo geralmente tem um forte foco nos homens como a raiz do problema

Acho que a conjuntura de informações que temos hoje mostra como um comportamento masculino pode ser danoso, desde o desequilíbrio da relação entre os gêneros, onde o homem se coloca como superior, até questões sérias de violência física, patrimonial e psicológica. Tudo isso ainda é legitimado por uma sociedade que acolhe, tolera e encoberta esses comportamentos. Logo, mesmo sendo possível que a expressão de pessimismo esteja vinculada ao homem em relação à mulher, o contrário se sobressai ainda mais e há motivos diversos para tal. 

Sua estrutura é antecipatória, projetada para anestesiar preventivamente o coração contra o horror generalizado da cultura heterossexual, e da aguda dor do romance cotidiano

Citando uma frase de Lee Edelman, a autora acredita que o heteropessimismo tem o papel de anestesiar os sentimentos de tal forma que o “apego consiga sobreviver ao desapego”. No bom português, isso seria algo como “mais pra lá do que pra cá”, ou seja, viver uma experiência sem se entregar 100% a ela porque existe desconfiança e medo presentes. Acho que qualquer mulher consegue lembrar de alguma situação vivida nos primeiros meses de um namoro onde teve a necessidade de prestar atenção em certos comportamentos do pretendente e levar isso para amigas de confiança com o intuito de checar se o que ela vê (seja positivo ou negativo) faz sentido ou é coisa da sua cabeça. 

Estar permanentemente, preventivamente decepcionado com a heterossexualidade é recusar a possibilidade de mudar a cultura heterossexual para melhor

Esse é um ponto muito forte da autora sobre a prevalência do heteropessimismo. Ela acredita que o sentimento em si não tem capacidade de mobilizar as estruturas que nos afligem. A tendência é que ele seja paralisante e, claro, pessimista. De fato, existe uma outra moeda que o heteropessimismo alimenta, especialmente quando é injetado no lado contrário: o ódio às mulheres. Homens que não querem corrigir seu machismo, enxergam com pessimismo as mulheres que reclamam dos comportamentos masculinos e colocam nelas a culpa deles estarem sozinhos. 

O artigo caminha para muitos outros lugares como discussões de gênero e sexualidade homoafetiva. Mas meu foco nesse texto é trazer essa informação sobre o termo e refletir sobre a condição de se relacionar com homens. Particularmente, estudar sobre esse assunto me ajudou a acalentar certas inseguranças que tenho a lidar com qualquer relação de troca com homens – inclusive amigos. Heteropessismo me ajudou a nomear com mais clareza um certo medo e apreensão que tenho e, por vezes, me fazia sentir mal ou julgadora de pessoas que mal conhecia. Agora, compreendo que pode ser um sentimento natural de quem viveu experiências prejudiciais em romances/paqueras héteros ou amizades com homens. 

FONTES: Folha de S. Paulo, Revista Galileu e The New Quiry

Opinião

O texto que você terminou de ler apresenta ideias e opiniões da pessoa autora da coluna, que as expressa a partir de sua visão de mundo e da interpretação de fatos e dados. Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal Umbu.

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