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Multiartista e uma das idealizadoras do Rolezinho IMuNe, Bia Nogueira celebra chegada a Salvador: “Eu sinto que está tudo no lugar certo”

Rolezinho IMuNe terá sua primeira edição em Salvador na próxima quinta-feira (25) e é realização de projeto da idealizadora

Foto: Reprodução

Iniciativa que fomenta a ascensão e expansão de artistas e agentes da área musical negros, indígenas, periféricos e LGBTQIAPN+, o Coletivo IMuNe (Instante da Música Negra), que surgiu em 2016 com o objetivo de trazer uma plataforma voltada à valorização e fortalecimento de artistas negros está há poucos dias de chegar com o projeto Rolezinho IMuNe a Salvador pela primeira vez. 

A capital baiana será uma das cidades a abrigar o Festival IMuNe no próximo dia 25 de abril, na Casa do Hip-hop, no Pelourinho. O projeto passará por diferentes pontos do país ao longo de 2024 e terá na programação shows em formato reduzido das artistas mineiras Iza Sabino, Cleópatra e Bia Nogueira, uma das idealizadoras do evento.

Antes de desembarcar em Salvador, a iniciativa abriu um edital no qual artistas locais puderam se inscrever para apresentar pockets shows no evento. 

Relembrando o começo do projeto, a cantora, atriz, produtora cultural e uma das responsáveis por materializar o Rolezinho e o Festival IMuNe, Bia Nogueira, contou como foram os primeiros passos para tornar a ideia real.

“Em 2016, oito anos atrás, a gente ainda não estava vivendo essa retomada, tanto do movimento negro, nem do movimento feminista, então não era uma pauta tão recorrente. A questão da representatividade ainda não tinha ganhado esse contorno que ganha hoje. Quando a gente fala em representatividade hoje, você não precisa explicar muito o básico. As empresas, a mídia, até aquele seu tio mais conservador já ouviu falar disso. Mas em 2016, não. Os editais de cultura, que a gente ainda vivia um período que tinha uma política cultural muito forte, se você fosse olhar o resultado dos editais, só tinha gente branca”, explica. 

“E era assim, uma arte muito elitizada, era ‘Grand Art’, era uma coisa meio assim ‘não tem espaço para a gente aqui’. E eu sou atriz também, eu tenho um grupo de teatro negro. Em 2015, o Grupo dos Dez montou o ‘Madame Satã’, que foi um espetáculo que rodou o Brasil, nesse espetáculo a gente discutia coisas relacionadas à homofobia, transfobia, machismo e racismo, sendo que racismo e transfobia eram os grandes motes e aí foi muito louco, um sucesso de público, mas ao mesmo tempo nós recebemos muita crítica falando que a gente era panfletário. E eu e meu irmão, que é o diretor do espetáculo, João das Neves,  um homem negro retinto, ouvia a crítica e falava: ‘Já que era para panfletar, nós vamos.”

Bia Nogueira em ‘Madame Satã’ | Foto: Guto Muniz

Bia conta que era como se ser panfletário fosse um xingamento. “Então, ao invés de negar que era panfletagem, a gente começou a falar que realmente era”, conta.

Nogueira ainda conta que o ‘estalo’ que teve para começar o Coletivo IMuNe foi na produção ‘Madame Satã”, quando relembrou seu desejo de lançar um disco com mulheres negras e pensou nessa simples ideia se tornando algo maior, o coletivo. “E toda essa carga, essa experiência de ‘Madame Satã’, me fez abrir o olhar para essa questão da música negra. Eu sou do teatro musical brasileiro, eu falei: ‘Cara, olha que só que engraçado, né? Eu queria lançar um disco e eu não via mulheres negras’. Eu tinha dois artistas negros aqui, que ganhavam editais, e tinha um produtor branco por trás dele, um aliado ali. Mas assim, eu estou dizendo o volume de gente preta e de mulher que não tinha. Aí a gente começou, eu montei o Coletivo IMuNe. Eu chamei uns 20 artistas, ninguém podia porque a galera era correria e precisava ganhar dinheiro e um coletivo de música não vai dar dinheiro, eu preciso fazer o meu.”

“Eu lancei o coletivo sozinha, eu fiz um show, fui fazer o lançamento do Coletivo IMuNe, eu preparei tudo, minha banda tocou de graça. Quando chegou lá, todo mundo que foi me assistir, que era preto e que era artista eu chamei para o coletivo. Assim surgiu o IMuNe  e, desde então, a gente vem fazendo mostras. A gente fez uma mostra sem grana nenhuma, logo que a gente lançou. A gente ia fazer uma mostrinha, abrir um edital só para falar assim:  ‘Vamos ver onde estão as pessoas negras aqui’,  quando a gente viu, o cara tinha 200 inscritos do Brasil inteiro e não tinha nem cachê, a gente falou: ‘Tem uma  dor aqui, tem um desejo, tem muita, mesmo, música preta e não tem espaço. A gente depois aprovou o projeto, começou essa de aprovar projeto. O Natura Musical foi um grande incentivo para a gente e agora a gente está expandindo, o IMuNe finalmente indo para Salvador. A gente já fez alguns festivais aqui, esse ano é um ano de expansão.”

“Desde o ano retrasado que a gente abriu o IMuNe para pessoas negras e pardas, e eu acho importante dizer o preto e o pardo porque o Brasil existe hoje uma disputa de narrativa e política sobre essas identidades. Na minha concepção de movimento social e de discussão, aqui é um espaço fomento, eu não quero trazer embate dentro do IMuNe, por isso a gente resolveu colocar pessoas negras e entendendo também que os ataques dos últimos quatro anos que a gente viveu foram muito graves e a gente pensou em abrir esse quilombo aqui. Vamos colocar os indígenas, periféricos, o público LGBTQIAP+, vamos falar de unificação nesse momento e não de decisão. Eu não quero discutir quem é preto e quem não é, eu quero assim, se você se reconhece aqui nesse lugar, tem que estar no IMuNe e eu tô muito feliz de ter pensado, junto com restante do coletivo, em fazer essa abertura porque ficou tudo mais gostoso.”

“A gente aprende toda hora com os indígenas, com as pessoas trans e aí a gente vê que não tem universalidade de discurso, de certezas. Eu sou uma mulher negra de pele clara, então é claro que eu tive que lidar com o assunto do colorismo ou o tempo inteiro e eu acho importante que a gente precisa reconhecer que pessoas de pele escura, pretas retintas são mais vilipendiadas, enfim, agredidas os que têm menos oportunidades.”

A vontade de vir à Bahia já existia no coração de Bia Nogueira e, só agora, com a turnê com o cantor Djonga, que esse desejo virou realidade: “Ricardo Rosa trabalha com cultura e eu o conheci em 2019.  Na época a gente estava fazendo o IMuNe, como eu nasci em São Paulo, na feira de música que tem lá, ele falou: ‘Escuta aqui, você tá fazendo um festival de música negra e na capital mais negra você não vai, não?’. E eu falei assim: ‘Mas é claro a gente tem que ir para Salvador.’  A gente tava com um grande plano de ir para Salvador junto com a parceria com ele e  aí aconteceu o fim do mundo, né? Veio a pandemia em 2020 e o IMuNe, que já tava começando a ser um festival itinerante, a gente já tinha ido para o interior de Minas,  já tava com verba que a gente aprovou Natura Musical e de Estadual, fazer em São Paulo e BH e já querendo ir para Salvador, e tudo aconteceu o que aconteceu e agora nós estamos retomando esse. Eu estou até arrepiada desse desejo antigo de circular na primeira capital do Brasil que a gente está indo é Salvador, eu acho muito emblemático e importante.” 

“Eu sinto que tá tudo no lugar certo. Eu me sinto muito contemplada pelo IMuNe. Eu tô muito feliz de chegar em Salvador. A gente ainda não tinha dinheiro para fazer o Imune em Salvador. Eu falei assim: ‘Eu vou tirar do meu dinheiro porque eu já vou fazer uma turnê com Djonga’. Eu vou cantar com ele, eu tenho um feat com ele no disco dele. Eu já vou estar em Salvador, nós já vamos abrir um Rolezinho IMuNe”, disse Bia. 

“Estou fazendo ‘na tora’, tirando do meu cachê do outro projeto que eu tenho para poder fazer. Só que a gente recebeu uma notícia que o nosso trajeto foi contemplado no Pixinguinha, ontem eu recebi essa notícia e aí a gente vai conseguir depois voltar em Salvador com uma estrutura melhor, então isso é genial”, comemora a artista.

A primeira edição do Rolezinho IMuNe em Salvador acontece na próxima quinta-feira e a programação pode ser conferida aqui.

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