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Dia de Caruru de Ibejis é símbolo de resistência no Brasil frente ao racismo religioso

É necessário manter viva a tradição daqueles que fizeram com que essa história se tornasse nossa hoje, os nossos ancestrais.

27 de setembro é dia de celebrar os santos Cosme e Damião no Brasil. Pelo país afora, pessoas se reúnem para distribuir doces entre as crianças e a correria é geral, com os pequenos batendo de porta em porta esperando suas doações de guloseimas.

Na Bahia, e também nas casas de pessoas devotas de religiões de matriz africana e dos orixás gêmeos, os Ibejis, a entrega do caruru e a cerimônia dos sete meninos é esperada quando chega esta época do ano. Estas cenas, no entanto, são cada vez menos comuns e um dos grandes motivos é o avanço do racismo religioso promovido, especialmente, pelas igrejas neopentecostais no Brasil.

Com a clássica desculpa de que a tradição tem referência ao ‘diabo’, crianças são constrangidas nas ruas e impedidas de se divertirem nas brincadeiras de Cosme e Damião e de aceitarem os doces, o que passam adiante, constrangendo outras crianças a não aceitarem, por estarem ‘pecando’, ou ‘aceitando oferendas’.

Por outro lado, existe também, um saudosismo quase apático por parte de pessoas que contam que “no tempo da minha avó, ela fazia um caruru e enchia a casa de gente”, sem se darem conta de que somos nós as herdeiras das tradições de nossas avós, e se a gente não passá-las adiante, quem vai?

Manter vivas as tradições de nossas pretas mais velhas é resistência contra o racismo, contra a intolerância religiosa que atinge majoritariamente as religiões de matriz africana, como o Candomblé e a Umbanda. Permitir que essas narrativas de que os doces são do diabo se espalhem sem resistência, simplesmente por achar que manter esse legado não é nossa obrigação, é compactuar com esse projeto nefasto de dominação que mira, desde cedo, em nossas crianças.

Torna-se mais que necessário o compromisso, entendimento e compreensão para se responsabilizar por manter uma tradição. Mas viver é compromisso. Manter vivas nossas histórias é um exercício de devolver para todos aqueles que estiveram antes de nós, um pouquinho do que nos fez chegar até aqui.

Cosme e Damião ou Ibejis?

O dia de São Cosme e São Damião, para os católicos, também é celebrado no Candomblé. Nesse caso, no entanto, comemora-se a tradição em 27 de setembro e, tendo como referência, dois orixás. “Não são as mesmas figuras, mas em ambas são irmãos com histórias de vida muito parecidas”, explica Pai Nino D Osumarê.

A tradição tem como referência os Ibejis, divindades africanas. Para o Candomblé, eram irmãos gêmeos que, em troca de brinquedos e doces, resolviam os problemas levados a eles.  “Resolviam problemas, garantiam colheitas mas, casos as promessas não fossem cumpridas, faziam travessuras e podiam até mesmo reverter o que havia sido pedido”, conta Pai Nino.

Segundo a história, um dos irmãos morreu afogado e o outro, extremamente triste, pediu ao “Deus supremo”, que o levasse. “Conta a tradição que foi deixada na terra uma imagem em que a figura dos dois apareciam juntas e jamais poderiam ser separadas. A partir de então, as promessas passaram a ser feitas para a imagem, também em troca de doces e brinquedos”, conta.

“Os Ibejis são celebrados com cultos próprios durante todo o ano, já que estão ligados a ideia de “criação”, são cultuados em todos os rituais”, explica Pai Nino. “Devido a convivência com a cultura cristã, também fazemos festa em setembro em que são distribuídos brinquedos, doces e Caruru (comida típica que pode ser acrescida de amendoim ou castanha) para as crianças”, explica.

Já na Umbanda, celebra-se Cosme e Damião e não os Ibejis, na mesma data. “Quando os escravos foram trazidos da África para o Brasil acabaram criando a Umbanda e, para poderem realizar seus cultos, associaram seus deuses aos do catolicismo. Mas o princípio é o mesmo”, conclui Pai Nino.

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