Na edição deste ano, a feira vai homenagear os 200 anos da Independência do Brasil na Bahia
Criada em 2021, por Cris Santana, uma mulher negra e produtora cultural, a Festa Literária Arte e Identidade teve mesa de lançamento nesta quinta-feira (21) de setembro. Pela manhã, na Casa Vale do Dendê, no Terreiro de Jesus, um café da manhã reuniu imprensa, convidados e representantes institucionais para divulgar a programação da edição que acontece entre os dias 5 e 7 de outubro, no Pelourinho.
Na parte da tarde, no Colégio Estadual Professor Rômulo Almeida, no bairro Imbuí, foi realizada a mesa “Diálogos com a comunidade escolar: Arte, Identidade, memória e história” com a participação de várias personalidades convidadas, entre elas a escritora indígena do povo Pataxó, Ane Kethleen Ferreira, 23, estudante de fisioterapia. Em entrevista ao Portal Umbu, a autora que nunca pensou em ser escritora, mas a vontade surgiu a partir de um sonho do seu avô:
“Eu vim para Salvador em 2018 para estudar fisioterapia na Universidade Federal da Bahia (UFBA) e, no final de 2022, acabei me tornando escritora indígena para realizar um sonho que não era meu, mas do meu avô. Eu nunca pensei em escrever, mas surgiu uma oportunidade na faculdade e acabou juntando com esse desejo de meu avô de deixar as histórias registradas, não só dele, mas da minha bisavó também, que é Zabelê, uma mulher muito importante no território indígena. Ela conquistou educação para o território, hoje lá na comunidade tem uma escola com o nome dela, sem dúvidas uma figura muito importante”, conta.
“Inclusive ela sobreviveu a um massacre que ocorreu na aldeia mãe, que se chama Barra Velha. Foi um massacre de policiais contra os indígenas e muitos deles morreram. Ela conseguiu fugir mesmo sofrendo tudo isso, ela não deixou a cultura dela morrer, ela estava ali resistindo, ensinando um pouquinho da língua que ela ainda sabia. A nossa língua se chama Patxorã, que significa língua de guerreiro, ela foi uma das pessoas que contribuiu para hoje termos uma cartilha com mais de mil palavras e temos ainda essa matéria dentro das escolas indígenas. É por isso e por outras histórias indígenas que eu vi a oportunidade de deixar registrado essas histórias”, afirma.
Ane Kethleen conclui dizendo:
“Meu avô é um grande compositor, um grande criador de poesia, ele observa muito a natureza e disso ele consegue tirar várias lições para a vida, esse sempre foi um sonho dele, e eu, quando vi essa oportunidade, de escrever essas histórias que não estão sendo contadas nos livros de história. A sensação de participar do Festival é de realização mesmo, porque é difícil estar na aldeia e ser vista, por isso a minha presença aqui em Salvador foi um processo de luta e resistência daqueles que vieram antes de mim, muitos morreram para que eu estivesse aqui, podendo registrar um pouco da nossa cultura. Me sinto orgulhosa, sinto que estamos no caminho certo, nossa luta não está sendo em vão, muito sangue foi derramado e está sendo derramado, mas estamos conseguindo conquistar esses espaços e estar aqui dando a voz, carregando o nome do povo Pataxó, o nome do povo indígena para o mundo conhecer”.
Pioneiro no fomento da Arte e Literatura Negra Infanto Juvenil na Bahia, o projeto propõe o estímulo à arte, leitura e construção de novas perspectivas a partir de narrativas da cultura negra. Este ano a terceira edição vai homenagear os “200 anos da Independência do Brasil na Bahia”. Uma das novidades desta edição é a “Feira Maria Felipa” – um espaço voltado para apresentação e comercialização de produtos afirmativos de jovens empreendedores negros da capital baiana.
Para a idealizadora do evento, Cris Santana, o festival é uma das suas grandes realizações e surgiu em um momento inesperado: “O Festival nasceu em um momento de recolhimento espiritual. Eu tive a ideia e pedi ao meu pai de santo um pedaço de papel e caneta para que eu pudesse anotar, e ele, claro, surpreso, pediu para que eu guardasse a ideia para depois que o momento passasse, e assim se fez. Quando saí, fui escrevendo em diversos editais até conseguir. Minha ideia era multiplicar, era levar a literatura negra Infanto Juvenil produzida por negros, autores negros baianos, para crianças negras, para o jovem negro, afim de despertar o pertencimento, a auto estima para que eles se vejam nas obras. A literatura negra infanto juvenil nas festas literárias só tem ações pontuais da literatura negra, então eu vi a lacuna no mercado de montar a partir daí desse insight, do momento espiritual de montar, produzir esse evento exatamente nesta lacuna, nessa necessidade que a gente tem de enfrentamento ao racismo, de oportunizar autores negros baianos de mostrarem, dar visibilidade a eles, as suas obras”.
“Estamos aqui, hoje, em uma escola estadual, e a escolha de fazer a abertura aqui é justamente porque o público deste festival são eles, eles são protagonistas também, porque tem fanfarras escolares presentes no evento e o pertencimento, da escola ser esse lugar de formação de ideias, foi a ideia de fazer esse convite de perto, mostrar um pouco do que vai ser o festival, como se fosse um esquenta da festa literária. O sentimento de poder ver esse auditório cheio é de gratidão, de dever cumprido, o objetivo do Festival Arte e Identidade é que os alunos não sejam só o nosso público, eu quero que eles sejam protagonistas do evento que é deles e para eles.”
Com acesso gratuito, o evento irá ocupar diversos espaços públicos do Centro Histórico de Salvador com lançamento de livros, contação de histórias, feira de livros, rodas de conversa, saraus, mesas literárias, bate-papo, entre outros. Outro destaque do projeto é a valorização da participação da comunidade local, destacando a participação dos estudantes das escolas da região e de escolas inscritas para participar das ações educativas da programação. A Festa Literária Arte e Identidade acontecerá entre os dias 5 e 7 de outubro, no Pelourinho, Centro Histórico de Salvador.
O festival é uma realização da Edcarlão Eventos e conta com o apoio da Rede Bahia, Rádio Educadora FM, TVE, Vale do Dendê e Governo do Estado, através da Fundação Pedro Calmon, Secretaria de Cultura e Secretaria de Educação do Estado da Bahia.
Confira a programação atualizada no @arteeidentidadeoficial e no site arteeidentidade.com.br