Mãe Bernadete foi secretária de Políticas de Promoção da Igualdade Racial de Simões Filho e, em encontro com Rosa Weber, denunciou ameaças a quilombos
A ialorixá, líder quilombola baiana e coordenadora da Conaq (Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos), Bernadete Pacífico, de 72 anos, foi assassinada a tiros dentro da associação do Quilombo Pitanga dos Palmares, localizada na cidade de Simões Filho, na noite desta quinta-feira (17).
Segundo a Secretaria da Segurança Pública da Bahia, dois homens, trajando capacetes, entraram no imóvel onde estava a vítima e efetuaram disparos com arma de fogo. Em entrevista a TV Bahia na manhã desta sexta (18), o filho de Bernadete, Wellington dos Santos, disse que os disparos foram feitos no rosto.
Após conhecimento do fato, as polícias Militar, Civil e Técnica iniciaram, de imediato, as diligências e a perícia no local para identificar os autores do crime. A Secretaria de Segurança Pública (SSP) repudiou o crime.
Quem também expressou seu pesar foi o governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues (PT), em suas redes sociais o mandatário disse estar indignado com a situação.
“Recebi com pesar e indignação a notícia do falecimento de Mãe Bernadete, uma amiga e grande liderança quilombola da Bahia. Determinei que as polícias militar e civil desloquem-se de imediato ao local e que sejam firmes na investigação”, disse.
O ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania do Brasil, Silvio Almeida, também determinou o envio de uma equipe da pasta até o local do assassinato.
Mãe Bernadete foi secretária de Políticas de Promoção da Igualdade Racial de Simões Filho, cargo que ocupou entre 2009 e 2016, enquanto Eduardo Alencar (PSD) era prefeito. Em julho deste ano, a ialorixá participou de um encontro com a presidente do Supremo Tribunal Federal, Rosa Weber, na comunidade Quingoma, em Lauro de Freitas, onde denunciou ameaças e violências à comunidade e pediu segurança para o seu quilombo.
Reconhecida pela atuação em defesa da cultura popular quilombola, Bernadete Pacífico recebeu o título de Cidadã Simõesfilhense em 2017.
Há seis anos, Gabriel Pacífico dos Santos, filho de Bernadete, conhecido como Binho do Quilombo, foi assassinado quando era líder da comunidade de Pitanga dos Palmares.
“Mãe Bernadete, agora silenciada, era uma luz brilhante na luta contra a discriminação, o racismo e a marginalização. Atuava na linha de frente para solucionar o caso do assassinato do seu filho Binho e bravamente enfrentou todas adversidades que uma mãe preta pode enfrentar na busca por justiça e na defesa da memória e da dignidade de seu filho”, diz o comunicado da Conaq.
A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, se pronunciou dizendo que “o ataque contra terreiros e o assassinato de lideranças religiosas de matriz africana não é pontual. O racismo religioso é mais uma faceta da conformação racista que estrutura o país e precisa ser combatido por meio de políticas públicas”.
Em nota, o Ministério da Igualdade Racial disse estar em contato com o governo baiano para ter mais informações sobre o crime.
“O Ministério da Igualdade Racial está em contato com o Governo do Estado da Bahia, a Secretaria de Promoção da Igualdade Racial e a Defensoria Pública do Estado para apurar melhor o caso”.
Em publicação de 2021, quando o assassinato de Binho do Quilombo, filho de mãe Bernadete, completava 4 anos sem respostas, a organização Terra de Direitos relembrou que disputas e tensões já eram ameaças constantes para os quilombolas da Comunidade Pitanga dos Palmares.
Conforme publicação, a área onde está localizada a comunidade não teve seu processo de regularização fundiária concluído pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), o que tornou o território vulnerável a invasões frente às disputas pelo direito à terra, a água e a vida.
A pesquisa “Racismo e violência de Quilombolas no Brasil” elaborada pela Conaq e Terra de Direitos revela que, entre 2016 e 2017, o número de assassinatos cresceu em aproximadamente 350%, com a Bahia sendo o estado com o maior número de assassinatos (13).
Já levantamento da Rede de Observatórios de Segurança, realizado com apoio das secretarias de segurança pública estaduais e divulgado em junho deste ano, apontou a Bahia como o segundo estado do Brasil com mais ocorrências de violência contra povos e comunidades tradicionais. Atrás apenas do Pará, a Bahia registrou 428 vítimas de violência no intervalo de 2017 a 2022.